Eu sou a lenda de Richard Matheson [Aleph, 2015]. Design: Pedro Inoue

Alunos de Design Gráfico entrevistam Pedro Inoue

O projeto "A forma do Livro", foi criado pela coordenadora e professora do curso de Especialização em Design Gráfico, Tereza Berttinardi, para que os alunos pudessem ter contato com designers brasileiros de destaque no mercado de projetos gráficos.

A primeira entrevista da série foi feita pelos alunos Joana Mello e Ricardo Martins com o designer Pedro Inoue. Pedro é designer gráfico e trabalhou entre, 2001 e 2007, com Jonathan Barnbrook, Marcos Allion e Elle Kawano na Barnbrook Design, em Londres, colaborando com clientes como David Bowie, Damien Hirst e Ryuichi Sakamoto. Atualmente vive em São Paulo e trabalha com diversos clientes da Europa, Japão e do Brasil.

Desde 2015, Inoue colabora com a Aleph, editora que se destaca pela publicação no Brasil de clássicos da literatura de ficção científica, como Frank Herbert, Isaac Asimov, William Gibson e Philip K. Dick. Os alunos conversaram com o designer sobre os projetos dos dois livros: "Nós", escrito pelo russo Ievguêni Zamiátin e "Eu sou a lenda", do romancista norte-americano Richard Matheson.

Qual foi o primeiro projeto que você desenvolveu para a editora?
Pedro Inoue: Minha relação com a Aleph começou com o livro Laranja mecânica. Na época que eles me chamaram, nunca tinha feito uma capa de livro. Era uma coisa que me interessava, mas, ao mesmo tempo, sempre achei as capas existentes muito chatas, muito ditadas pelo departamento de marketing. Acho mais divertido, por exemplo, desenhar uma capa de CD, em que você tem uma troca maior com o músico/artista do que com a gravadora. Em Londres, tive muita sorte de trabalhar num estúdio que trabalhava com pessoas como David Bowie. Isso me deu uma oportunidade de troca em um nível tal que você cresce MUITO com o trabalho. São projetos com os quais você aprende muito… quando você admira o artista, a coisa cresce mais ainda. Então, isso me fez adotar uma destas regrinhas: “só vou trabalhar com pessoas que eu admiro.” — não tem por que trabalhar com quem eu não admiro, pois o trabalho vai ficando cada vez pior e você perde com isso.

Quando a Aleph me procurou para fazer a capa do livro, topei com duas condições: 1) o marketing não ditaria nada nesse trabalho; e 2) que pudesse fazer uma coisa superpop, contemporânea e saísse dessa ideia pronta que se entende por capa de ficção científica. É muito engraçado, qualquer lugar que você vá, as capas de ficção científica são iguais: todas com um desenho e tipografia velhos, tipografias em alto relevo douradas… aí você pensa: “ai, gente, sério?”. O que eu topei — e o pessoal da Aleph também — foi mudar um pouco isso. Foi um parto para saírem os primeiros trabalhos, a série do Phillip K. Dick e o Laranja mecânica. A série do Dick é uma coisa superengraçada, pois as pessoas amam e odeiam. Quando eu fui dar uma palestra na Feira Galáctica, em 2016, eu perguntei para a plateia: “quem gosta do Dick?”, e metade levantou a mão; “quem odeia o Dick?”, e a outra metade levantou a mão. É um dos trabalhos mais díspares.

Então, foi esse o começo do meu trabalho com a Aleph. Depois de um certo tempo, obviamente, as coisas foram se encaixando. Hoje eu tenho uma relação superboa com eles. Prefiro trabalhar com amigos do que com gente que eu não conheço. Isso porque o caminho já está trilhado, você entende até onde pode puxar e onde não pode. Acho muito saudável exercitar este debate, porque você cria uma ideia de respeito com o seu próprio trabalho, isso é superimportante.

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Qual a importância de ler o livro antes de desenhar a capa? Como a capa que você fez para o livro Nós se relaciona com o texto?
Pedro Inoue: Eu gostaria MUITO de ler todos os livros antes de fazer as capas. Eu também gostaria MUITO de fazer duas capas por mês, me dedicar ao máximo, ganhar 3 mil dólares por cada capa que eu faço. Mas, infelizmente, a realidade não é essa. Tem certos livros que eu já li, que me ajuda bastante, outros leio partes. Para o livro do Zamiátin, eu estudei bastante, tem muito a ver com a minha pesquisa pessoal. Eu li ele depois de fazer a capa.

Num mundo ideal, acho que tudo faz parte: ler os livros, assistir os filmes, escutar o álbum. Mas o mundo que a gente vive não é o mundo ideal, então, tem momentos em que é possível fazer isso, outros não. Particularmente, no caso dos livros é mais difícil, requer muito tempo de dedicação. Mas cada trabalho é uma plataforma. Você não entra em uma pizzaria e pede um queijo quente, por exemplo. Então, há certos lugares, trabalhos comerciais em que você não vai poder revolucionar com uma tipografia ilegível. Mas tem, de repente, algumas situações em que isso é possível. Eu fiz uma capa para um catálogo do MASP, da primeira exposição de grafite do museu, e a capa era ilegível. A ideia era que fosse ilegível mesmo, era exatamente isso que eu estava buscando: uma capa completamente useless, inútil.

O Nós, em particular, tem muito a ver com fascismo, ditaduras — são questões que se relacionam muito com o meu trabalho na Adbusters, a revista canadense na qual eu sou editor criativo. Falamos muito sobre anticapitalismo, anarquismo, Donald Trump, a extrema-direita, o MBL — temas que passam muito perto da temática do livro. Por exemplo, a escolha de mudar a tipografia durante o livro: queria muito essa mudança. Queria que capa e contracapa tivessem linguagens totalmente diferentes: de um lado, uma coisa mais autoritária; de outro, uma coisa realmente mais solta.

Clique aqui e confira como foi a entrevista na íntegra.

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