Alexandre de Maio. Foto: Kel Lima/VICE

Uma conversa sobre os corres de Alexandre de Maio

Aproveitando o evento sobre jornalismo em quadrinhos com Alexandre de Maio, que acontece no dia 14 de Junho na EBAC e o lancamento de seu novo livro, Raul, nós conversamos com ele para saber mais sobre sua história e seus corres pelo mundo do rap, HQ's e do jornalismo. Alexandre já publicou mais de 40 reportagens em quadrinhos e lançou livros de ficção em quadrinhos, baseadas em fatos reais. Aqui, ele conta sobre sua história no jornalismo, nos quadrinhos e com Raul: o do livro e o da vida real.


 


Antes de falar sobre Raul, quero voltar um pouco na sua história. Você começou no jornalismo criando sua própria revista de rap, a Rap Brasil. E depois foi para o mundo do desenho e das HQs. Como e onde tudo começou?
Sempre gostei de desenhar e fui muito mal na escola, era o cara que ficava no fundão da sala desenhando. Aconteceu uma coisa terrível na minha rua, uns caras brigaram e uma menina morreu com uma bala perdida. Eu fiz um quadrinho sobre isso. Na mesma época o Racionais tava começando e eu também fiz um quadrinho sobre a música To Ouvindo Alguém me Chamar, eu mandei esse quadrinho pros caras do Racionais e eles me ligaram dizendo que gostaram. E foi assim que eu comecei a fazer HQs que mostravam a realidade, sempre com uma matéria sobre rap no final. Achei uma editora que publicou a primeira revista e quando ela caiu na banca, explodiu de vendas. 


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Além da Rap Brasil, você foi pioneiro na criação de HQs que escancaram a realidade das periferias brasileiras como “Os Inimigos não mandam flores”, "Génération Favela” e “Meninas em Jogo”. Qual é o papel social e político que os seus quadrinhos e a sua arte tiveram na época?
Quando eu comecei em 1999, os quadrinhos eram de ficção e baseados em fatos reais. Em 2010, comecei a fazer o jornalismo em quadrinhos, que não fossem aqueles tipo padrão super-heróis da Marvel e sim algo que as pessoas olhassem e dissessem “Isso é o Brasil”, isso é algo que eu reconheço. Existia muito pouca representatividade brasileira nas HQs

Os índices de criminalidade e problemas sociais me chocavam muito. Nas primeiras edições, o quadrinho já começava e terminava com dados sobre a violência no país. Por isso eu tive essa preocupação em mostrar a realidade e falar das causas sociais. Mostrar a vida do negro, pobre e jovem que vivia na periferia e que ninguém tinha ouvido falar na época, já era algo inédito, uma causa.


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Como os veículos de mídia recebem o seu conteúdo que é jornalismo, mas apresentado de uma maneira tão inovadora em formato de quadrinhos? Fica mais fácil ou leve abordar esses temas pesados em forma de arte?
O Jornalismo em quadrinhos passou a ter um papel muito forte dentro do jornalismo justamente porque algumas pautas são meio complicadas e como você falou, difíceis de ser digeridas pelo público. O quadrinho tem esse primeiro impacto visual que é direto, não precisa ser lido para ser entendido.

A primeira linguagem e forma de comunicação usada por nós foi o desenho, então a imagem tem muita força. Isso junto com um conteúdo interessante, começou a dar muito certo. Como eu já tinha trabalhos sobre as causas sociais, comecei a fazer vários projetos pra vários veículos que têm ligações com causas sociais como o Catraca Livre, a Agência Pública, a Revista Fórum...e foi uma chuva de pautas de direitos humanos. Todo os meus trabalhos estão ligados a problemas sociais. Por isso o lance da HQ é legal.


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Raul é o seu primeiro trabalho 100% solo. Qual foi a dificuldade de levantar esse projeto sozinho?
Foi difícil e fácil. Fácil porque apesar de ter entrado em contato com o Ferréz, quando você faz sozinho, a liberdade é grande e você não precisa alinhar o seu tempo de produção com o de outra pessoa e fazer um livro leva um tempo, normalmente anos. Ao mesmo tempo é difícil porque é muito legal trabalhar com alguém, eu tava acostumado a trabalhar em parceria a vida toda, a maioria foi de trabalhos em conjunto como o Meninas em Jogo com a Dip, com o Greenpeace, o Uol e etc. As editoras de livros não entendem muito de quadrinhos e foi muito legal achar a Elefante, que tem tudo a ver com o formato e tem esse rolê mais independente.


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E a sua história com o Raul, como se conheceram e como é a relação de vocês? 
Na época que eu fazia as revistas de rap, também promovia uma festa da revista em uma balada da Vila Madalena. E eu conheci ele lá, era um rapper que tava em ascenção, já abria shows pra grandes nomes do rap e tal e a gente tinha alguns amigos em comum. De repente ele apareceu no MSN e falou “Então...eu to preso aqui em Brasília” e a gente começou a trocar ideia. Quando ele saiu, a gente voltou a conversar, ele contou como fazia os golpes e várias outras histórias.

Nessa época eu queria muito lançar alguma coisa diferente, minha carreira no Jornalismo em HQ já tinha dado certo e eu pensei “putz, preciso fazer um livro”. E aí surgiu essa história do Raul, que nasceu e cresceu na Baixada do Glicério, que é uma periferia no meio do centro de São Paulo. Esse era o livro que eu queria fazer.


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O Raul confiou em você desde o começo e topou contar toda a história dele em forma de quadrinhos?
No Raul eu mudei o meu estilo de desenho e fiz todos os personagens sem rosto e as cenas em preto e branco. Eu queria que fosse uma história não tão jornalística, com dados e tal e sim uma história mais fluida mesmo. Eu troquei ideia com o Raul e perguntei se ele tinha confiança em mim, se ele queria que eu contasse essa história e ele disse que sim.

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Qual é a mensagem mais importante que o livro ensina pra nós, que não conhecemos o Raul?
O livro conta a história dele, desde quando ele nasce lá na Baixada do Glicério, a infância e como ele começou no crime, então o livro tinha uma ordem meio cronológica. Não existe nenhuma matéria que fale sobre os golpes do cartão porque é um crime invisível, ninguém percebe quando acontece, não tem arma, não tem uma violência concreta. Tem 200, 300 pessoas fazendo isso todos os dias no Brasil inteiro. Então o livro fala sobre isso, um cara que sempre quis viver de arte e de música, conseguiu por algum tempo, mas teve uma hora que deu ruim, ele começou a ganhar pouco e a mensagem do livro é essa: estar preso em um padrão de vida quando você chega no ápice da grana ou voltar alguns passos pra trás, ganhar menos e fazer o que você gosta. A prisão é o dinheiro.


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